Uso obrigatório de máscara, novas regras para as áreas comuns e restrições de acesso, principalmente para entregadores.
Essas são apenas algumas medidas que não só podem como devem ser tomadas pelos condomínios em meio à pandemia da Covid-19. Com o isolamento social e trabalho remoto, muitas pessoas ainda estão dentro de casa. Para barrar o vírus e evitar dores de cabeça com vizinhos, mudanças são necessárias.
E tudo precisa ser regulamentado e comunicado aos moradores. As decisões, segundo o advogado especialista em Direito Imobiliário e presidente da Comissão de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em Contagem, Allan Milagres, devem ser deliberadas em conjunto, democraticamente. Confira a entrevista.
Como e quais são os procedimentos para reabrir as áreas comuns dos condomínios neste momento de pandemia?
Quando falamos em condomínio, a gente está falando em pluralidade de pessoas, de moradores e proprietários. Existem condomínios com seis moradores ou 300, 400 moradores, vertical ou horizontal. Por isso, é preciso se preocupar porque tem uma coletividade e aquele pode ser um ponto de disseminação e contagio. É preciso identificar quais são os regramentos, as legislações de cada condomínio. O Código Civil, que é a legislação que dita as regras do condomínio, diz que o legislador especifica o que é regra, mas quando não houver uma especificação, a obrigatoriedade é da convenção. Todas as regras devem estar na convenção e no regimento interno. Todo prédio registrado, obrigatoriamente, tem uma convenção e um regimento interno no Cartório de Registro de Imóvel.
Normalmente, as convenções são mais antigas e não preveem uma situação como esta, de pandemia. Como proceder?
Aconselho que os condomínios sempre revisem as convenções, o que a gente chama no Direito de reratificação, ou seja, é juntar 2/3 dos moradores e abrir uma votação para sugestões. É preciso observar as regras de espaços comuns, área de lazer, entrada e saída de entregadores, funcionários e colaboradores, a questão do barulho porque as pessoas estão trabalhando em casa. Nada disso estava previsto ou especificado nas convenções. É preciso fazer, da forma mais democrática possível, reuniões ou assembleias buscando a atualização dessas regras que são extremamente necessárias hoje em dia.
“Se é preciso mudar algo urgente, é necessário uma assembleia. O que for competência da convenção, é preciso registrar no cartório, e o que for de competência do regimento interno deve ser alterado no documento também”
O condomínio pode proibir o trânsito de pessoas que estejam sem máscara?
Pode. Como estamos vivendo momentos mais intensos da Covid-19, o condomínio pode restringir o trânsito de pessoas que não estejam usando máscara, mas, não o síndico. Essa decisão precisa ser de forma deliberada. Aconselho aos condomínios seguirem as regras definidas pelos poderes públicos municipal e estadual e aplicar de forma analógica.
Além de proibir o trânsito de pessoas sem máscara, o condomínio também pode multar as pessoas?
Pode. O condomínio vai criar essa norma e, principalmente, especificar se haverá multa ou não e como ela será paga, que pode ser no próprio boleto da taxa do condomínio. Todo pagamento de multa deve ser acompanhado de um procedimento com as explicações em relação à medida. Não pode ser uma medida arbitrária. O condomínio pode adotar, por exemplo, uma notificação ou advertência na primeira vez da infração e só cobrar a multa após uma reincidência.
O condomínio também pode restringir a entrada de entregadores, já que neste momento aumentou o número de pedidos?
Sim. O condomínio pode criar uma sistemática de recebimento de mercadoria. Exemplo: o morador vai retirar essa mercadoria apenas na portaria. Existem moradores que têm problemas de locomoção ou necessidades especiais e precisam estar incluídos de forma clara nas regras para não serem prejudicados. Uma dica é colocar avisos para os entregadores usarem todos os cuidados na hora da entrega, principalmente em prédios pequenos, sem porteiros, e o condomínio deve disponibilizar o álcool em gel logo na portaria, em locar visível.
Como ficam as regras para o salão de festas?
É preciso acompanhar os decretos estaduais e municipais. Há pouco tempo, a orientação era para não ter nenhum encontro, seja familiar ou entre amigos. Agora, já houve uma flexibilização, mas sabemos que a aglomeração ainda é o principal meio de disseminação do vírus. Podem ser criadas regras para o limite de pessoas, que vai variar de acordo com o tamanho da área. O síndico pode, inclusive, buscar a opinião de um especialista, como um técnico em segurança do trabalho ou até mesmo um infectologista. Um outro caso é que o salão de festas também é usado para as assembleias e reuniões, o que aconselho é que elas sejam feitas de forma virtual.
E as piscinas, quadras e áreas de churrasqueira? Como ficam? Só para os moradores?
Sim, ainda estamos combatendo a Covid-19. Se o poder público já determinou como os clubes devem fazer, os condomínios devem seguir as mesmas orientações. Não adianta as pessoas pensarem que por serem proprietários ou inquilinos de um imóvel em um condomínio, estão à margem do que está sendo aplicado pela sociedade, não faz sentido. Qualquer morador pode fazer uma denúncia de irregularidade e encaminhar ao síndico que vai tomar as devidas providências.
Elevadores também devem ter número de pessoas restrito?
Não só pode, como deve restringir. Podemos incentivar as pessoas a utilizarem mais as escadas para evitar a aglomeração nos horários de pico. É importante afixar comunicados e circulares com as regras.
“É necessário criar as regras, mas é preciso saber onde que elas serão inseridas. Não dá para, simplesmente, falar que é regra porque votaram na assembleia. O síndico não pode acordar e falar: ‘agora vou multar e obrigar o uso de máscara’.”
Como fica o caso dos prestadores de serviço, como faxineiros?
A primeira coisa a fazer é, se o condomínio tiver condições, contratar um técnico em segurança do trabalho para dar as orientações corretas. É preciso saber quais são os equipamentos que o condomínio precisa fornecer para esses profissionais, como máscara especial, álcool em gel, e orientar como fazer o revezamento dos turnos para evitar contato. Se o condomínio não tiver condições de contratar um técnico em segurança, é aconselhável reunir alguns moradores e montar um plano estratégico.
Muitos moradores aproveitaram este momento de pandemia para fazer reforma. Qual orientação nesse caso?
Que o morador faça apenas as reformas essenciais, com plano estratégico de duração da obra e com horários dos pedreiros, e tudo deve ser comunicado ao síndico para evitar problemas futuros.
Um assunto delicado é a questão da inadimplência. Muitas pessoas perderam o emprego ou tiveram redução na jornada de trabalho e, consequentemente, na renda, e deixaram de pagar a taxa do condomínio. Como lidar com essa situação na pandemia?
Esse é um ponto muito importante. A inadimplência reflete na saúde financeira do condomínio, que tem uma equação, a receita e a despesa. É possível até diminuir a receita, mas não dá para diminuir as despesas já que existem as contas mensais e precisam ser quitadas. Infelizmente, houve pouco cuidado das autoridades públicas em atenção aos condomínios durante a pandemia. Isso quer dizer que não houve desconto em água, energia, impostos municipais. O que o condomínio pode fazer é dar desconto neste momento, como não cobrar aquele valor de reserva durante um determinado período. No caso dos inadimplentes, a melhor maneira de sanar esse problema é parcelar a dívida, para não entrar com uma ação judicial que pode penhorar o imóvel. É preciso muita cautela e bom senso.
Fonte: Hoje em Dia